A beleza não está nos olhos de quem vê


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26 de março de 2020

Tempo de Leitura: 6 minutos

A beleza não está nos olhos de quem vê


Em um momento de tantas críticas a forma do corpo das mulheres, te convidamos para fazer uma reflexão sobre beleza e julgamento

Se você está nas redes sociais já deve ter visto uma imagem que une fotos de 4 diferentes mulheres famosas: Bruna Marquezine, Cléo Pires, Paola Oliveira e Graciane Barbosa. O que elas tinham em comum? Todas receberam críticas a respeito do seu corpo. “Muito magra!”; “Nossa, como ela engordou!”; “Está cheia de celulite!”; “É muito musculosa!”. Essa imagem levantou um debate importante sobre como o corpo da mulher parece nunca agradar os olhares dos outros – independente de suas formas.

Quando se fala em mulheres e beleza, há um padrão que se considera mais “atraente”, que foi evoluindo e se transformando de acordo com cada período e contexto histórico. Segundo a psicóloga e pesquisadora Raquel Moreno, no século XVI essa beleza estava na parte superior do corpo. A beleza era percebida nos olhos, na delicadeza e nos traços simétricos. Nos séculos seguintes começou a valorização da parte inferior do corpo: pernas, quadris e cintura. “No século XVIII, a arte de individualizar complementa a visão do conjunto da silhueta, sendo a beleza individual e a singularidade realçadas e encorajadas”, comenta em seu livro A beleza impossível: Mulher, mídia e consumo. No século XX, o corpo passa a ser minuciosamente examinado e o avanço da indústria dos cosméticos vem com a promessa de deixar a “beleza ao alcance de todas” e, por isso, houve, segundo Moreno, a necessidade de unificar gostos e padrões para que esse novo mercado crescesse. A mídia recebeu a função de propagar tais modelos, produtos e estilos de vida – e assim, resumidamente, foi criado o que hoje chamamos de “padrão de beleza”.

Esse ideal de beleza difundido cria o desejo pela perfeição, mesmo que inconsciente. Esse desejo vem de nós e vem dos olhares críticos dos outros, que buscam ver o “belo” e rejeitam o que não se encaixa a isso. Porém, tudo o que precisamos para enfrentar essa onda de críticas ao corpo e julgamentos sobre a nossa aparência é de um olhar gentil – que deve vir de você, primeiramente, mas que também pode vir das pessoas ao seu redor.

A fotógrafa Gabriela Borgo é uma das pessoas que tem esse olhar gentil. Ela descobriu que fotografar mulheres era a sua grande paixão – e tem a plena consciência de que o seu trabalho vai muito além de fotografar. Suas fotos buscam fazer com que a mulher que está do outro lado da lente se liberte, se encontre e  se enxergue. “Todas as mulheres que eu atendo são lindas, mas não se enxergam da forma como eu as enxergo. Então acabamos fazendo um trabalho interno e trazemos a tona coisas que estão guardadas”, conta. Gabriela percebeu que todas elas tinham em comum uma mesma marca: alguém, em algum momento da vida, geralmente na infância ou adolescência, colocou alguma limitação para elas. “Que o peso dela não estava bom, que se vestir de um jeito não era correto, que se achar bonita era não ser humilde. São coisas impostas, até mesmo de forma inconsciente, e que trazem uma insegurança na fase adulta muito grande. Então temos mulheres que não se olham no espelho, não se tocam, que não conseguem admitir sua própria beleza”, continua. E isso impacta a forma de como as mulheres se veem e até mesmo a forma de como veem outras mulheres.

Porém, desde o fim do ano passado, Gabriela tem sentido uma abertura maior por parte das mulheres para se olhar de uma forma diferente, afinal, muitas vezes é difícil para elas se deixarem ser fotografadas de uma forma mais natural. “A maioria dessas fotos não são expostas, são feitas somente para elas. Em 100% das mulheres que eu atendo, as questões internas só ressaltam o externo. Quando ela identifica de onde veio a insegurança com a beleza dela o ensaio passa a ser outro.  Começamos a fotografar fazendo respirações, entrando mais a fundo, indo para infância… A insegurança fica enraizada e acaba se tornando algo muito maior. Hoje também temos vivido muito essa questão de ‘não pode envelhecer’, ‘não pode ter estrias’, ‘não pode ter marca de expressão’, mas essas são as suas marcas. Elas te trouxeram até aqui. Se eu conseguir colocar um pontinho de interrogação nelas através das minhas fotos, fiz o trabalho certo”, comenta.

J-u-l-g-a-m-e-n-t-o
Como seres humanos, queremos pertencer a um grupo – e muitas vezes, as questões ligadas a beleza fazem parte desse pertencimento. Essas questões caminham em direção a uma outra: o julgamento. Quantas vezes não damos mais importância ao que o outro pode pensar ou não sobre nós? As quatro famosas citadas no início do texto passaram por isso. Não foi a primeira e, infelizmente, não será a última vez. Os julgamentos acontecem – mas cabe a nós decidir a importância que daremos a eles.  “Nós somos muito acostumados a colocar a culpa no outro, mas a questão é: que poder você está dando pro outro? A responsabilidade é sua e temos que aprender a assumir as responsabilidades pelos nossos próprios sentimentos, a não dizer ‘estou triste por causa do outro’. Quando a mulher entender que ela é responsável por aquilo que fazem para ela e assumir a responsabilidade por ter deixado alguém dizer a ela que estava gorda, por exemplo, e perceber que ela deixou aquilo a afetar, ela se empodera”, pontua Gabriela.

A fotógrafa também observa que a geração de mulheres de 20 e poucos anos consegue lidar de uma forma melhor com todas essas questões referentes a beleza e aos comentários. “A nova geração de mulheres tende a ser incrível, pois vemos que elas são mais evoluídas nessas questões sobre o que é ser bonito ou belo. Afinal, a beleza é uma questão de cultura, conteúdo e diferentes padrões – não existe certo ou errado”. Para todas as mulheres, Gabriela deixa um conselho: “Todos os dias fique por pelo menos 5 minutos na frente do espelho, de preferência nua, sem maquiagem, e se olhe. Se dê um elogio sincero por dia. Veja o quão maravilhosa você é, do jeito que você é, com as suas marcas. Você já é incrível por estar no mundo, olha esse mundo! Você já é incrível por sair de casa todos os dias e fazer o que você faz. Então se olhe e se elogie. Assim, as coisas que você não gosta vão ficando cada vez menores, pois vão se tornando insignificantes perto do que você vê”.

Se for mudar, mude por você
Quando se fala em beleza há críticos dos dois lados: aqueles que exaltam o natural e condenam qualquer mudança e aqueles que fazem todas as mudanças possíveis para fugir do seu natural. Mas a verdade é que não existe certo ou errado quando se fala da imagem que temos de nós e da imagem que buscamos. Nós precisamos encontrar o nosso equilíbrio no meio de tantos julgamentos e aprender a discernir os desejos por mudança que são genuinamente nossos. Você pode não estar feliz com alguma coisa em seu corpo e querer muda-la. E isso pode ir da cor do seu cabelo até o formato do seu seio. Porém, um problema acontece quando esse desejo de mudança não é genuinamente seu e surge de uma crítica de um namorado, pai, mãe, amiga…

A Gabriela Cantarelli trabalha há quase 5 anos no comando da Magrass em Passo Fundo, uma franquia reconhecida em todo o Brasil por seu programa de emagrecimento. Diariamente ela acompanha mulheres que buscam transformar a forma como vivem e se veem. “Nossas clientes buscam através do emagrecimento e da qualidade de vida o resgate da saúde, autoestima, empoderamento, algumas vezes dificuldades físicas devido estar em sobrepeso. Diariamente recebemos mulheres que desejam uma transformação em suas vidas, pois não conseguem usar mais as roupas que usavam anteriormente, ou não conseguem brincar com o filho, ou as roupas que gostava de usar estão marcando as dobras do corpo. Relatam histórias que se sentem sem autoestima e confiança em si mesmas”, ressalta.

Segundo ela, as mudanças acontecem de forma gradativa durante o período de tratamento, pois quando elas começam a sentir os efeitos do emagrecimento e dos hábitos saudáveis, começam a cuidar mais do cabelo, do corpo, usar maquiagem, mudam o estilo de roupas, voltam a usar salto alto. “E essas mudanças são gratificantes para nós, pois nosso trabalho vai além da eliminação de peso ou medidas. Independente do padrão físico, uma mulher bonita é aquela que tem como prioridade sua saúde, seu cuidado e seu bem-estar, pois sabe que estando bem consigo mesma influenciará as pessoas que estão ao seu redor. Uma mulher bonita é aquela que é humilde em atos e ações. É aquela que possui confiança, segurança e autoestima”, acredita. Para ela, ter consciência da importância de cuidar da saúde, não apenas para o momento atual, mas para o futuro, e consciência para cuidar do corpo com carinho, com dedicação e equilíbrio são fatores que auxiliam muitas mulheres a se sentirem bem com seus corpos.

E é por tudo isso que a beleza não está nos olhos de quem vê. Ela está em você e na sua forma de se relacionar com o mundo, com o seu corpo, com a sua mente e com as pessoas ao seu redor.

 

Fotos: Gabriela Borgo



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