Orlando Faccini Neto, presidente eleito da AJURIS, compartilha suas expectativas para a gestão


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26 de março de 2020

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Orlando Faccini Neto, presidente eleito da AJURIS, compartilha suas expectativas para a gestão


Eleito presidente da AJURIS para o biênio 2020-2021, Orlando Faccini Neto nasceu em 19 de novembro de 1976, em São Paulo (SP), e, aos 43 anos, é um dos mais novos presidentes que já assumiu a Associação.  Faccini é formado pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo (SP). É mestre em Direito Público pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) e doutor em Ciências Jurídico-Criminais pela Universidade de Lisboa (Portugal).

A história de Faccini na magistratura do Rio Grande do Sul começou no 11 de setembro de 2001, como ele costuma lembrar, quando a edição do Diário Oficial publicou o resultado do concurso para juiz que participou, no mesmo dia do ataque terrorista ao World Trade Center, em Nova York. Ainda em 2001, assumiu como titular da comarca de Jaguarão e, em 2004, a Vara Criminal de Carazinho. Em 2011, foi promovido para a comarca de Passo Fundo, também na área criminal. Em 2016, se transferiu para Porto Alegre e assumiu como titular do 1º Juizado da 1ª Vara do Júri, de onde está afastado atualmente por sua atuação associativa. O novo presidente da AJURIS também atuou durante um período no gabinete do ministro Felix Fischer, no Superior Tribunal de Justiça, em Brasília, auxiliando em julgamentos de recursos de processos da Operação Lava Jato. Nesta entrevista ele compartilha a sua trajetória e projeta as expectativas para a sua gestão.

Que lembranças você tem dos seus anos de atuação nas cidades de Carazinho e Passo Fundo? Em Carazinho eu permaneci por sete anos, de maneira que foram muitos casos importantes que recaíram em minhas mãos. A principal lembrança que eu tenho da época é do trabalho articulado e muito competente da Polícia Civil de Carazinho e também do Ministério Público e da Defensoria Pública. Os advogados também foram sempre muito colaborativos para permitir que os processos criminais fossem julgados num prazo razoável, encontrando a solução adequada. Em Passo Fundo, atuei por cerca de quatro anos, também em vara criminal, com casos de muita repercussão na cidade, sobretudo envolvendo a criminalidade mais organizada e, em certas circunstâncias, casos mais inusitados que procurei resolver com denodo.

Que caminhos te levaram à presidência da AJURIS? Alcançar a presidência da AJURIS era efetivamente algo que eu não ambicionava, mas a vida muitas vezes nos leva por caminhos que nós não esperamos. Quando retornei da minha temporada em Brasília, em 2017, passei a ter uma participação associativa mais frequente e isso me levou, também pelo fato de eu ser um magistrado relativamente conhecido pelos meus pares, a ser convidado a ser vice-presidente da Associação e, posteriormente, a candidatura a presidente se tornou um caminho natural a tal ponto que a chapa por mim liderada não teve adversários. É uma posição honrosa que consequentemente gera uma grande responsabilidade na representação da classe.

Quais são as responsabilidades que essa posição representa? A responsabilidade da presidência da AJURIS é imensa na medida em que a Associação tem um papel político importante. Deve dialogar com os demais órgãos de Estado e com as demais associações de classe, além de evidentemente buscar melhorias na condição de trabalho dos juízes sob variadas perspectivas. Tenho observado que de 2001, quando ingressei na carreira, até hoje houve um decréscimo na autoestima dos magistrados gaúchos uma vez que procuram realizar a atividade jurisdicional com correção, mas enfrentam problemas estruturais, como a falta de servidores e a implantação ainda parcial do processo eletrônico, enfim, diversos fatores que não permitem que os magistrados e magistradas trabalhem com a velocidade que almejam. Isso precisa efetivamente melhorar uma vez que temos uma magistratura qualificada e bem preparada, mas que deve ter o aparelhamento necessário para o desenvolvimento de suas funções.

Qual é a pauta prioritária da sua gestão frente à entidade? É buscar melhores condições para os juízes e juízas do Rio Grande do Sul, restabelecendo o orgulho, o brio e, se poderia até mesmo dizer, a honra de sermos juízes nesse Estado. Há muitos jovens que procuram, a partir de concurso público, ingressar na magistratura, é um concurso dificílimo, poucos têm a ventura de obter a aprovação, então é necessário que a magistratura seja valorizada. Eu penso que também é importante que essa valorização se dê por parte da opinião pública, mas infelizmente no Brasil e no Rio Grande do Sul há uma espécie de olhar atravessado para tudo que compõem o serviço público, e a magistratura está dentro desse contexto. Por isso é necessário que as pessoas compreendam as dificuldades dessa atividade que lida com dramas humanos terríveis, que muitas vezes atua diante de uma criminalidade perigosa, que precisa resolver casos complexos no âmbito do Direito de Família, envolvendo crianças, envolvendo cônjuges, envolvendo em outras situações o patrimônio das pessoas. E essa é uma atividade que precisa de respaldo do ponto de vista da sociedade, e eu procuro mostrar um pouco mais o que os juízes e juízas realizam para que tenham o reconhecimento necessário dada a nobreza da função que exercem.

E quais serão os principais desafios da sua gestão? Creio que o principal desafio da gestão é mostrar com equilíbrio e serenidade os interesses da magistratura e discuti-los no âmbito da opinião pública que hoje vive um momento de altíssima polarização, em que as conversas e os diálogos parecem campear para brigas e altercações, mas é preciso que saibamos respeitar a divergência, ouvir as críticas, mas também fazer os apontamentos necessários para revelar aquilo que a magistratura do Rio Grande do Sul pretende, colocando-se mesmo como um poder de Estado na medida em que os juízes são servidores públicos, mas também agentes políticos e, nessa condição, estão legitimados a participar das discussões que envolvem as questões mais altas do Estado em que vivemos.

Como representante dos magistrados, como você avalia o Judiciário do Rio Grande do Sul? Os índices do Conselho Nacional de Justiça e suas estatísticas mostram que há 11 anos a magistratura do Rio Grande do Sul é uma das mais operosas e produtivas do país, liderando o ranking nacional. Portanto, creio que a avaliação é altamente positiva, mas sempre é possível, e diria mesmo necessário, que melhoremos a prestação dos nossos serviços, tanto do ponto de visto do tempo para prolação de decisões quanto do rigor técnico e da qualidade do nosso trabalho. Isso não se faz apenas a partir da atuação dos magistrados, é necessário que tenhamos um corpo de funcionários qualificados, mas infelizmente hoje vivemos um quadro em que as nomeações de servidores são cada vez mais raras, há problemas legislativos a esse respeito, muitos têm se aposentado, e os cartórios judiciais padecem da falta de pessoal e isso naturalmente embaraça o desenvolvimento da atividade judicial. Além disso, a própria questão da implantação do processo eletrônico ainda não encontrou a solução cabal no Estado e faz com que os magistrados convivam muitas vezes com dois ou três sistemas de informática para o desempenho de suas tarefas. Essa operação acaba tomando um tempo que poderia ser utilizado para a atividade fim de um juiz, que é presidir audiências e julgar processos. Portanto, é necessário que essas condições estruturais sejam equacionadas para que os juízes e juízas tenham o campo de sua atuação mais liberado e, assim, produzam tudo aquilo que for possível produzir.

O que te motiva a trabalhar em prol do direito da sociedade e dos magistrados? A motivação é a que eu trago comigo desde que ingressei na magistratura em setembro de 2001. Sempre extrai dessa atividade enorme realização pessoal, mas depois de praticamente 18 anos como juiz atuando no julgamento de processos também me pareceu que era importante retribuir à magistratura do Rio Grande do Sul e aos meus colegas aquilo que recebi durante o período em que exerci a jurisdição no âmbito dos processos. Assim, ainda que com algum sacrifício, já que na presidência da Associação eu me afasto da jurisdição e eu gosto muito de exercê-la, eu tenho a impressão que é compensador fazê-la em benefício da classe e dessa magistratura que, repito, me acolheu e me entregou momentos muitos felizes da minha vida.

 



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