A ILUSÃO DO AMOR, ILUSÃO INSUSTENTÁVEL E IRRENUNCIÁVEL
A ilusão do amor idealizado é uma concepção impregnada em nossa cultura. Mesmo que para alguns grupos isso já tenha modificado, essa ideia segue tendo pregnância em grande parte da sociedade. Os relatos cinematográficos abordam a paixão, na maioria das vezes passageira e seu vigor é guardado pela força da recordação, fixado como um momento eterno, maravilhoso, único e descontínuo.
Segundo os psicanalistas Rodolfo Moguillansky e Silvia Nussbaum, esta ilusão não se baseia na relação assimétrica entre amado e amante, e sim na ideia de um “fino conjunto” no qual os envolvidos sentem ter encontrado o reencantamento com o mundo, sentem que seus corpos se insuflam de vida e que a paisagem que os entorna encontrou a perfeição de um cartão postal pela eternidade.
Entretanto, todo vínculo amoroso tem que lidar, passo a passo, com uma desilusão de estrutura. Aqueles que não conseguem assimilar a realidade permanecem fixados no ideal construído em cima de uma ilusão, guiando-se pela denominada lógica binária: ou é sublime ou tudo será destruído.
O produto da lógica binária, pelo que se observa na clínica de casais, se dá pela impossibilidade de sustentar a “ilusão de ter a mesma ilusão”. O amor passional segue essa lógica, o encontro do amor transtorna a temporalidade supondo a perfeição eterna. O ódio surge com intensidade em resposta ao não cumprimento desta expectativa e devido à impossibilidade de renunciar a ilusão do enamoramento. Piera Aulagnier refere que os pares podem se apresentarem de forma idêntica e fusional, dentro de um gozo que elimina o espaço que separa os dois corpos, ocasionando prejuízo não somente em forma de inquietação e confusão, mas podendo conduzir o sujeito à borda da loucura.
No relacionamento estável, o vínculo é construído no dia a dia, baseando-se no enfrentamento da quebra da ilusão da paixão inicial, possibilitando a evolução do amor maduro. O amor maduro se fundamenta na regularidade de intercâmbios, organização, (establishment) conduzindo o casal a estabilidade e segurança, apoiada no manejo das diferenças e respeitando a alteridade.
O vínculo estável é desafiante porque envolve desilusão, mal entendidos, faltas, falhas, ausências, descompassos e desacordos. Enfim, exige maturidade e menos fantasia. Porém, o amor passional é violento, baseado num lógica binária que leva ao sofrimento.
A ilusão do amor é insustentável no vínculo estável, mas a paixão como sonho ou como vivência é parte do desejo humano e por esse motivo, irrenunciável, pelo menos no plano da fantasia da união perfeita. O cinema através dos filmes e a música com suas letras refletem essa realidade humana, concordam?
Para encerrar, um trecho da música de Caetano Veloso chamada Drão:
Drão, o amor da gente é como um grão
Uma semente de ilusão
Tem que morrer pra germinar
Plantar n’algum lugar
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